O Português «a bom ritmo»

Canadá

O interesse pela língua e pelas culturas portuguesa e dos países de língua oficial portuguesa tem vindo a crescer «a bom ritmo» no Canadá, o que se tem reflectido no alargamento da oferta de cursos nessas áreas nas universidades canadianas. Mas as razões do crescimento desse interesse apresentam por enquanto respostas parciais.

Número 133   ·   17 de Dezembro de 2008   ·   Suplemento do JL n.º 997, ano XXVIII

Canadá
College University, Universidade de Toronto. Foto de JP Phillips CC
Este é o quadro que se pode traçar a partir das declarações de José Pedro Ferreira, leitor do Instituto Camões (IC) no Departamento de Português e espanhol da Universidade de Toronto, que está a desenvolver, em co-autoria com Rita Rolim, leitora do IC na Universidade de York, um projecto de investigação para conhecer qual a situação do Ensino do Português no Canadá ao nível universitário.

Os resultados preliminares desse estudo, o qual não abrange outros níveis de ensino que não o universitário, foram apresentados em Outubro último no Congresso Internacional O Ensino do Português nas Universidades da América do Norte: Situação e Desafios, que teve como palco o departamento universitário a que o docente português pertence.

O estudo, ainda a decorrer, visa também recolher na medida do possível, para além dos dados mais significativos sobre o ensino do Português, numa primeira fase, informação sobre «o ensino de disciplinas como a Cultura, a Literatura ou a História, entre outras, que contribuem para o que poderíamos chamar Estudos Portugueses», explica o leitor do IC na Universidade de Toronto.

Em concreto, o estudo registou «o ensino de cursos de Língua Portuguesa em 20 universidades canadianas, nas províncias de British Columbia, Alberta, Saskatchewan, Manitoba, Ontário e Quebeque, portanto da costa leste à costa oeste, em 6 das 13 províncias e territórios que constituem o Canadá», diz José Pedro Ferreira.

Nas 20 universidades mencionadas, um total de 18 professores assegura o ensino da Língua Portuguesa (LP) e de outras disciplinas relacionadas, sendo que daqueles, quatro são professores colocados pelo Instituto Camões nas universidades de York, Toronto, Otava e Montreal, refere o docente.

Quanto ao número de alunos, «os dados que conseguimos apurar referem-se ao ano lectivo de 2007/08, em que cerca de 800 alunos estavam a frequentar cursos de programas de Português em sete universidades». Mas o seu número deve ser superior, já que nem todas universidades responderam ao pedido de informação, explica José Pedro Ferreira.

A oferta e o ensino do Português nestas 20 universidades oscilam entre «cursos livres e programas universitários, estes existentes apenas em quatro universidades canadianas, nas províncias do Quebeque e Ontário», acrescenta.

Os graus podem ir desde a licenciatura, a certificações mais baixas como o major ou o minor, ou uma mera aprovação numa disciplina de Português ou numa cadeira relativa a cultura ou área técnica de um país da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP).

Tradicionalmente, refere José Pedro Ferreira, o ensino de Português e Cultura Portuguesa já era oferecido em universidades como a de Toronto (desde 1947), York (desde 1983), ambas em Toronto, e Montreal (desde 1973) e Otava. O ensino da LP, nestas quatro universidades, é actualmente oferecido em agrupamentos de cursos de Literatura, de História e de Cultura, que assim, diz José Pedro Ferreira, «completam (...) os requisitos indispensáveis para que os programas de Português existam».

Mas quer estas quer novas universidades, têm alargado a sua oferta de cursos relacionada com a Língua e Cultura Portuguesas, como reflexo do interesse académico e do aumento da sua procura.

 

Razões

A Universidade de Toronto, no dizer do seu docente, «é a que apresenta o programa mais extenso na área do Português - o Specialist - que possibilita ao aluno completar a sua licenciatura (undergraduate degree; 20 créditos) com uma formação maioritariamente em Português (9 ou mais créditos)». E frisa: «temos a certeza de que todos estes programas vão continuar a crescer e a desenvolver-se em direcção à investigação científica».

Dando conta do alargamento que se tem verificado, José Pedro Ferreira menciona a expansão curricular dos cursos de Português, em 2008/09, na Universidade de York, que passou a oferecer Programas de Minor e Major; o início da oferta de um curso de Português, a partir de 2006, como parte dos Cursos de Verão oferecidos na Universidade de Toronto, com crédito académico reconhecido para os vários programas de Português, Minor, Major e Specialist; a criação, em 2001/02, do Programa de LP e Culturas Lusófonas na Universidade de Montreal; e a criação da Cátedra de Cultura Portuguesa dedicada à investigação e a estudos de pós-graduação nesta última universidade, na sequência da assinatura em 2007 de um protocolo com o IC.

Em 2008/09, acrescenta o leitor português, «abriram dois cursos de Português na Universidade de Guelph, onde alguns professores se têm vindo a dedicar, de forma mais ou menos lateral, ao estudo de temas e questões relacionadas com a Língua e a Cultura Portuguesas».

As razões que estão por detrás desta intensa movimentação à volta do Português escapam por enquanto aos investigadores, que afirmam não serem «significativos» os dados recolhidos. «Aquilo que podemos dizer é que, com base no que temos vindo a observar, sempre existiu e continua a crescer o interesse social, cultural, empresarial, académico e científico por questões e temáticas relacionadas com a Cultura e a LP», não só relativamente a Portugal, como aos restantes países de LP. Também pesam, naturalmente, acrescenta José Pedro Ferreira, o interesse académico pela América do Sul e África, em que aqueles países se inserem.

Adiantando algumas razões, o leitor do IC afirma ser lógico o interesse pelo Português, «uma das línguas mais faladas no mundo, uma língua cuja importância global cresce diariamente». Mas há também outras razões para querer estudar Português, que ele descreve como «emocionais e culturais», como seja facto de parte dos estudantes serem luso-descendentes. As estimativas apontam para a existência de cerca de meio milhão de portugueses e luso-descendentes. Acresce os que efectuaram viagens de estudo ou turísticas a Portugal, Brasil e aos países africanos. Há também ainda os que aprendem a LP por «interesses profissionais relacionados com qualquer desses países».

Nas universidades de Toronto e York, cerca de 75% dos estudantes são de descendência portuguesa, mas há casos em que isso não acontece, como nas universidades de Waterloo (Ontário), em que apenas 50% são descendentes de pais portugueses, ou nas universidades de Brock (Ontário) e British Columbia (British Columbia) em que apenas 10 e 15% são de herança cultural portuguesa, indica José Pedro Ferreira.

«Como país multicultural que é, o Canadá possibilita a cada uma das comunidades imigrantes existentes a manutenção e a valorização das respectivas heranças culturais», sublinha José Pedro Ferreira. «No caso de alguns alunos que conheço, eles sentem-se tão portugueses como canadianos, outros mais canadianos do que portugueses, alguns manterão mesmo mais laços afectivos com Portugal, acontecendo o mesmo com alunos mexicanos, brasileiros, italianos ou russos, isto é, procuram conciliar na sua identidade individual aspectos particulares das heranças que recebem e da sociedade em que vivem e da qual fazem parte».

Poder-se-ia pensar que a opção pelo Português, que está naquilo que alguns descrevem como segundo nível das línguas mundiais, pudesse assustar os jovens canadianos. Mas, afirma o docente português, «numa sociedade multicultural como é a canadiana, há oportunidades profissionais para falantes de muitas línguas, entre as quais, o Português». As empresas de imigrantes portugueses, áreas de negócio de grandes empresas, áreas da saúde e do comércio, administração pública - «todas elas geram oportunidades de emprego para os jovens universitários falantes de português», diz. «Falar português pode ser um factor determinante para conseguir trabalho, além de ser sempre uma valorização curricular e pessoal».