Morreu Manuel António Pina

Publicado em segunda-feira, 22 outubro 2012 08:38

Morreu Manuel António Pina (1943-2012), o poeta, o jornalista, o cronista, o autor de livros para crianças, o dramaturgo, o ensaísta, o advogado – um ser de afetos para quem «O amor é a única coisa capaz de sobreviver e a única coisa por que vale a pena que sobrevivamos.

O amor no seu mais vasto sentido, naquele que São Paulo lhe dá na Primeira Epístola aos Corintos, quando diz que vai indicar o caminho que ultrapassa a todos.» (Casal das Letras).

Comendador da Ordem do Infante D. Henrique (2005), quando, em 2011, Manuel António Pina soube que lhe tinha sido atribuído o Prémio Camões por toda a sua obra afirmou: “É a coisa mais inesperada que podia esperar”.

O autor licenciou-se em Direito na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra e foi jornalista do Jornal de Notícias durante três décadas, tendo sido depois cronista do Jornal de Notícias e da revista Notícias Magazine.

A sua obra está traduzida em França (francês e corso), Estados Unidos, Espanha (espanhol, galego e catalão), Dinamarca, Alemanha, Países Baixos, Rússia, Croácia e Bulgária.

Manuel António Pina, entrevistado por Carlos Vaz Marques, foi o destaque da edição de janeiro da LER. Uma entrevista que pode (re)ler agora: http://revistaler.no.sapo.pt/pdfs/LER_109entrevista_pina.pdf

 

A meu favor tenho o teu olhar
testemunhando por mim
perante juízes terríveis:
a morte, os amigos, os inimigos.

E aqueles que me assaltam
à noite na solidão do quarto
refugiam-se em fundos sítios dentro de mim
quando de manhã o teu olhar ilumina o quarto.

Protege-me com ele, com o teu olhar,
dos demónios da noite e das aflições do dia,
fala em voz alta, não deixes que adormeça,
afasta de mim o pecado da infelicidade.

Manuel António Pina, in “Algo Parecido Com Isto, da Mesma Substância”

A um Jovem Poeta

Procura a rosa.
Onde ela estiver
estás tu fora
de ti. Procura-a em prosa, pode ser

que em prosa ela floresça
ainda, sob tanta
metáfora; pode ser, e que quando
nela te vires te reconheças

como diante de uma infância
inicial não embaciada
de nenhuma palavra
e nenhuma lembrança.

Talvez possas então
escrever sem porquê,
evidência de novo da Razão
e passagem para o que não se vê.

Manuel António Pina, in “Nenhuma Palavra e Nenhuma Lembrança”